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Entrevista com o ex-professor Gilmar de Carvalho.

 

O curso de Jornalismo da UFC foi criado em 1965, ainda como habilitação em Comunicação Social. No entanto, com o passar dos anos, as instituições de ensino optaram por um currículo mais especializado, que prevalece até hoje. A que deve essa segmentação da área?

 

O afunilamento, no que se refere à especialização e criação de nichos de atuação, veio como reserva de mercado para a categoria e como estratégia das Universidades e Faculdades para abrir um leque de possibilidades, dentro do que se chamou de Comunicação. O Curso que fiz era "polivalente". Com o diploma podíamos fazer quase tudo neste campo: jornalismo, publicidade, cinema, teatro, editoração, só as relações públicas exigiam uma complementação da carga horária. A segmentação da área arejou o mercado e possibilitou uma atuação mais específica e sofisticada dos profissionais formados.


O cenário da Comunicação do final dos anos 70 e começo dos anos 80 era bem diferente do de hoje, e, certamente, as demandas também. Como o curso preparava o estudante, por exemplo, para o mercado de trabalho?
 

A preparação para o mercado era muito precária. Os estágios nos davam uma desenvoltura maior, mas era pouco. O curso era muito descolado das práticas. Não tínhamos laboratórios, os professores vinham do Direito e apenas a Professora Adísia Sá foi fundo, prestando concurso para Professor Titular e trazendo um aprofundamento das questões que muito contribuíram para a formação das turmas dos primeiros tempos.

 

Quando você ingressou no curso, o contexto era de convulsões sociais mundo afora, incluindo o Brasil, que vivia uma ditadura. Como o curso recebia, reagia, se posicionava quanto a isso?
 

Os estudantes sempre foram contra o arbítrio. Não tínhamos Centro Acadêmico. Foram fechados depois do AI-5. O clima era pesado. Alguns professores mantinham relações promíscuas com a repressão. Estávamos sempre ameaçados. Fui representante estudantil da Comunicação, contemporâneo da Rosa da Fonseca, representante das Ciências Sociais. Tínhamos falsos estudantes nas salas de aulas, olheiros da ditadura. Apesar dos ares que respiramos hoje, da liberdade que temos para falar e divergir, para manifestar nosso desagrado ou nossa contestação, a UFC ainda mantém o nome de um ditador (Castello Branco) no auditório da Reitoria. Isso me causa profunda indignação e repulsa.


Em um ano de crise e de medidas de austeridade, o sucateamento das universidades públicas, tanto na infraestrutura quanto nos recursos humanos, não pode faltar ao debate. Em todos esses anos, como você percebeu esse fenômeno aqui na UFC?

 

As Universidades Públicas vivem um momento de apogeu. Investe-se na infraestrura, temos concursos para professores (ainda que mantenhamos os substitutos), temos boas bibliotecas, laboratórios. A UFC viveu um momento crítico no governo FHC. Chegávamos, nós professores e servidores, a trazer papel higiênico e sabão para os banheiros. Faltava tudo. O afã de privatizar do Ministro Paulo Renato era tanto que até hoje não sei como escapamos. Talvez pelo fato de que as telefônicas e a Vale do Rio Doce fossem mais apetitosas para o mercado que universidades sucateadas. Mesmo na crise, sempre tivemos uma Universidade e nunca um colégio de terceiro grau.
 

Hoje a ascensão das mídias digitais obriga o jornal impresso a se reformular e afeta até a audiência dos telejornais. Acerca disso, quais as perspectivas para o futuro do jornalismo?

 

Os jornais estão confusos, apostam num "design" que nem sempre é sedutor. Leitor de jornalismo é conservador, no sentido de querer saber o que vai encontrar e onde encontrar. Ninguém compra jornal por conta de bossas gráficas ou de mostruário de cartela de cores. Jornal é basicamente texto. E textos de qualidade são cada vez mais raros. Boas entrevistas estão na Revista Entrevista, da UFC, do laboratório dos alunos do professor Ronaldo Salgado e não nos jornais. Textos curtos, imitando a linguagem dos blogs não vão salvar os jornais. Eles precisam se reinventar, logo, antes que seja muito tarde.

Av. da Universidade, 2762, Centro de Humanidades II, Campus do Benfica. O Câmbio é um projeto independente desenvolvido pelo PETCom. Site desenvolvido por Igor Cavalcante, Gabriela Vieira e Layton Maia, com wix.com. 2014/2015.

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